Próximo capítulo

não perca o décimo segundo capítulo... será que Adão e Eva se entenderão, sendo tão diferentes?

Capítulo 11: quando Eva se assustou com Adão.

Eva tinha surgido no mundo e Adão queria sumir dele. Ela tinha mexido tanto com o homem, que ele estava com muita vergonha dela. Quem será ela? Será que ela vai gostar de mim? Como eu vou me apresentar a ela, de um jeito que não parecerei um idiota? 
 - Bom dia, Varoa, você viu que por aqui é tudo muito bom?, não não... - Adão ensaiava seu discurso inicial – Olá varoa, seus olhos, por trás do véu, são pombas, seu cabelo é como um rebanho de cabras... não e não, muito fora de contexto!
 Então começou a pensar assim, que agiria como ele mesmo age com o leão e com os outros animais. Foi aí que teve uma grande ideia: escondido entre as árvores, olhou fixamente para Eva.
 Traçou uma linha reta imaginária entre ela e ele, então tomou distância. Daí estufou o peito para pegar ar, preparou as pernas, colocou-se em pose de ataque, como um touro. Quando estava pronto, estourou a correr como um louco em direção a mulher. Trombou com ela e ela voou longe! Seus ombros acertaram os peitos da mulher que ela nem deu tempo de ver o autor da brincadeira, disparou para o ar e para o chão.
 Adão caiu dando grandes gargalhas, que divertido! Pensou. A mulher era levinha, arremessou ela longe!
 Foi aí que olhou para ela. Ela estava caída, descabelada e coberta de folhas: e FURIOSA! O olhar da mulher para Adão era de matar, ela respirou e deu um grito GGRRRRRR!!!
 Numa outra tentativa de estabelecer contato pacífico com aquele novo ser aconteceu enquanto Eva caminhava sossegadamente e feliz. Colhia margaridas e colocava nos cabelos quando ela viu surgir bem na sua frente um homem pulando que nem um sapo e gritando como um macaco, impedindo sua passagem. Tentava desviar, mas o homem/macaco não deixava.
 - Sai, sai daqui - dizia ela.
 Desesperado, Adão pulou como um macaco nas árvores, e ficava pulando de galho em galho. Mas Eva passou, sem dar a menor bola. Quando ele deu aquele grito estridente dos macacos, ela se virou, olhou fundo nos olhos dele, e mostrou a língua!

Adão concluiu que definitivamente aquela varoa não era como um macaco ou como um leão!

Capítulo 10: Quando Adão viu Eva pela primeira vez.

Adão acordou.
 Tinha sido o primeiro e o mais profundo sono, depois de um choro triste de solidão e tristeza. O homem deu aquela espreguiçada, e dizem que foi a mais longa e gostosa do mundo! Depois dos estalos do corpo, Adão continuava se sentindo muito estranho. Sentia um vazio dentro e fora dele, era como se estivesse pela metade. Correu para o espelho d´água, passou a mão pelo seu corpo e não se reconheceu direito. Sabia que estava diferente: apertou o nariz, olhou atrás da orelha, procurou debaixo do braço e não descobriu o que era.
 Naquele momento, bem perto dali, um grupo diversificado de passarinhos fazia um fuzuê. Como a curiosidade era mais forte, o homem se levantou para ver o que era. Caminhou devagar, desconfiado, pois sabia de tudo o que acontecia naquele mundo e estava assustado porque não tinha previsto aquela agitação.
 Enquanto o canto dos passarinhos ficava mais alto, Adão podia ver uma imensa nuvem colorida em movimento, eram milhares de borboletas e passarinhos em círculos, dançando e comemorando felizes. Cantavam celebrando alguma coisa. Os passarinhos e as asas da borboleta formavam um belíssimo coro de canto e instrumentos de música: era a primeira canção do mundo.
 Havia também um perfume estonteante no ar. Era um perfume tão maravilhoso que Adão começou a rir sozinho, sentir cosquinhas no pescoço. Eram as flores, estavam todas agitadas e lançando aquele perfume, presenteando o ar.
 De todas as direções, pequeninos animais corriam curiosos e alegres, e mergulhavam naquela nuvem colorida e dançante. De repente, a nuvem se abriu, e o ser a que o planeta saudava havia se mexido. Era a mulher, rodeada de passarinhos, borboletas e flores. Ela estava se abaixando para fazer colo aos animaizinhos pequeninos e passou a niná-los com os braços e acariciava com o rosto aqueles que subiam sobre seus ombros para beijá-la.
 - Que lindos animaizinhos!
 Adão caiu para trás. Aquele novo ser e sua voz deixou o homem zonzo. Ficou imóvel por muitos instantes, até que ela passou por ele, sem enxergá-lo. Quando ela passou, Adão perdeu o fôlego de novo, ficou vermelho até que ela tomou distância novamente, só então o homem pôde recuperar o fôlego de vida.
 Borboletas estavam na mente e na garganta do homem, borboletas vermelhas e risonhas que causavam cosquinhas no coração. Não sabia se ria ou se falava alguma coisa. Sua linguagem estava como as borboletas, dançando e cantando. Teve que inventar a poesia:
 - Esta, finalmente,
 é osso dos meus ossos,
 e carne da minha carne.
 Teu nome será Varoa,
 porque do Varão foi tirada!

Capítulo 9: quando Adão tentou criar outro do barro.

- Você vem sempre aqui? - perguntou Adão a uma passarinha que estava naquele galho, a sua altura. Ele tinha ajeitado o cabelo, jogado uma água nos dentes e passado umas flores no pescoço pra dar um cheiro. 
 Era que ele estava se sentindo triste e sozinho. Seus amigos todos tinham alguém que os correspondessem, que fossem iguais a eles. Então ele chegou junto dos porcos, tomou alguns copos de caldo de cana com eles e se lambuzou na lama. Depois, decidiu tomar uma atitude. Foi aí que tomou um banho no rio e se produziu do jeito que disse. Agora, estava tentando conquistar a primeira fêmea que encontrou, mas a passarinha logou voou do galho, rindo do homem. Ele até que correu atrás dela, mas já não podia alcançá-la.
 Ele a estava procurando entre as nuvens, onde tinha sumido, quando duas pombinhas pousaram em seus ombros.
 - E se você pedisse a Deus! - disse uma delas.
 - Isso, peça a Deus que faça, novamente do barro, alguém que lhe corresponda e seja como a sua cara metade – disse a outra.
 - Que boa ideia! - exclamou o homem.
 - Você pedirá a Deus? - perguntaram elas.
 Mas o homem já estava preparando o barro.
- Vamos ver, como eu posso fazer outro igual a mim e que me corresponda.
 Observando de longe, ambas as pombinhas concordaram:
 - Não é bom que o homem esteja só.
 Olhando-se pelo espelho d´água, Adão ia modelando o barro conforme a sua imagem e conforme a sua semelhança, por sua própria conta.
 Enquanto isso, Deus passeava por ali, até que se encontrou com Adão, todo sujo de barro. Por impulso, pelo susto e depois por medo, Adão disparou para longe, correndo para dentro da mata, deixando seu boneco de barro, disforme, erguido em frente a Deus.
 O Todo Poderoso olhou curioso a escultura, com um leve sorriso no rosto, como de um pai que vê um desenho borrado do filho pequeno dizendo que era ele. Deus riu e se compadeceu de Adão. Olhando para as pombinhas, disse:
 - Não é bom que o homem esteja só.
 Uma das pombinhas confirmou:
 - Foi o que eu disse pra ele.
 No meio da mata, Adão corria sem pensar, fugindo não sabia de quê. Foi aí que começou a chorar muito, chorar alto, era o primeiro choro. Parou e sentou-se encolhido numa árvore, chorando incontrolavelmente, por muito tempo. Como todo choro dá sono, Adão dormiu, assim mesmo, no meio da tarde. Apesar de dormir chorando, o homem não sabia, mas estava mergulhando no mais feliz e agradável de todos os sonhos. Um sonho tão magnífico que ninguém poderia narrá-lo. Era um sonho que mantinha Adão entretido, sem perceber que seu corpo passava por transformações que iriam mudar a sua vida completamente.

Capítulo 8: quando Adão falou com a serpente.

Adão procurou seus amigos para se recompor de suas frustrações agrícolas. Mas não é que o leão tinha encontrado uma leoa? O bichano estufou o peito para a fêmea que lhe correspondia, e os dois tinham ido passear. Por causa disso, Adão foi chamar o cordeiro, que apareceu feito um cachorrinho de alegria ao ver o amigo finalmente disponível. Em seguida, no entanto, ouviram uns gemidos de dor, e quando correram para ver, era uma linda cordeirinha enroscada em um arbusto.
 - Socorro, vim comer umas folhas, fui entrando no arbusto e agora não consigo sair.
 Enquanto Adão, com muita facilidade, desprendia a fêmea, o cordeiro correu acudir a cordeirinha que lhe correspondia, e ela só teve ouvidos para os olhos apaixonados do cordeiro. Adão percebeu que estava sobrando.
 Foi espairecer sozinho em um monte, de olhos para o céu, aquecendo-se no sol. De repente, uma sombra sobre seu rosto escondeu-lhe o sol.
 - O que faz aí, tão sozinho?
 Era a serpente, que costuma aparecer perto de corações confusos.
 - Sozinho, eu?
 - É por isso que você está tão triste?
 - Triste, eu? - a serpente estava conseguindo convencer Adão da solidão e da tristeza.
 Adão sentou-se, ficando à altura da serpente, e perguntou:
 - O que você sabe sobre tristeza e sobre solidão?
 Então a serpente deu um riso de desdém, dominadora:
 - Ah! Sei que é horrível ser triste e sozinho...
 A serpente se virou e começou a caminhar, dando uma última olhada no homem, como convite a segui-la. Assim, Adão começou a engatinhar na direção da serpente.
 - Ei, espere, como faço para deixar esta tristeza e esta solidão?
 - A primeira coisa a fazer – dizia a serpente, sem olhar para ele, seguindo em frente – é escapar deste sol que ofusca nossa vista.
 Quando Adão percebeu, a iluminação tinha acabado e um leve frio arrepiou seu braço. É que estavam agora encavernados embaixo de uma grande árvore que os abraçava com seus galhos. Era tão grande e espessa que tapava o sol e impedia o vento fresco de passar.
 - Depois... – continuou a serpente, subindo agora pela árvore e desaparecendo no verde amarelado das folhas, dando ainda para ouvir seu último conselho, como saindo delas – depois, é bom experimentar coisas novas.
 Adão entendeu muito bem o que a serpente queria dizer: era um convite para experimentar do fruto daquela árvore, que parecia tão desejável.
 Quem passasse ali perto, veria Adão de repente jogar-se para longe da árvore, como se tivesse sido atacado por ela. Lá debaixo ele tinha visto a marcação que havia feito no chão para saber do perigo da árvore do conhecimento do bem e do mal. A árvore tinha mudado de forma, de pequena para enorme, estava irreconhecível!
 Ainda muito ofegante e assustado, pegou vários galhos e enterrou-os em vertical em volta da árvore, traçando cordas em horizontal entre eles, como uma cerca. Nunca mais queria correr aquele risco de chegar tão perto de uma árvore que parecia tão desejável.

Capítulo 7: quando Adão teve pressa em cultivar a terra.

O sol estava lá no alto, e além de ser carinhoso, as nuvens absorviam qualquer intenção de excesso de calor que tirasse a perfeição daquele dia. Nesta manhã, Deus havia dado uma ordem a Adão: que cuidasse do jardim e desse nome às coisas. Embora estivesse um pouco atrapalhado, estava inteiramente envolvido com o trabalho. Mergulhou tanto na atividade que até esqueceu que Deus estava por ali, tanto que nem percebeu quando Ele foi embora. 
 Estava tentando arrumar um ajudante: falou com os macacos, mas simplesmente não conseguiam ajudar. Depois tentou com as tartarugas, pior ainda.
 - Não há aqui ninguém que possa ser um auxiliador idôneo, ninguém que possa ser meu companheiro de trabalho.
 Frustrado, decidiu então deixar um pouco de lado a ciência, e partiu para a agricultura. Foi até a região da terra seca, sem qualquer plantio. Desenhou na areia mais ou menos um plano: aqui plantaria isto, ali plantaria aquilo etc. Estava animado para que ainda naquela tarde tivesse um novo jardim naquele lugar.
 Saiu colher as sementes. Fez diferentes cestinhos de folhas, em que depositava tipos diferentes de sementes. Em seguida, demarcou toda a área, e passou a um delicado trabalho de depositar as sementes. Arrumou-as com cuidado e zelo. Estava entretido naquele trabalho de tal modo que não adiantava o leão o chamar para brincar no rio.
 Quando terminou de depositar todas as sementes, olhou orgulhoso para todo aquele campo.
 - Vamos descer na cachoeira! - chamavam o cordeiro e o leão – depois você volta aqui.
 Adão nem respondia.
 Quando concluiu o trabalho de depositar as sementes, ajoelhou-se sobre uma delas e passou a soprar sobre o montinho. Soprou e soprou e nada da folha crescer. Não acontecia como Deus havia feito. Deus soprava e a folha crescia imediatamente. Decidiu soprar outra, e outra, mas elas não cresciam como quando Deus fazia. Começou a pensar que tivesse feito o trabalho errado. Começou a perder a paciência. Deus havia dito que ele tinha que esperar a plantar crescer, no seu tempo devido, mas ele não estava com paciência para aquilo, precisava muito ver o resultado do seu trabalho naquele momento. O que Deus tinha que o homem não tinha? O que Deus sabia que o homem não sabia?
 Assim a sua frustração aumentou, sentiu-se impotente diante daquela terra seca que não brotava e começou a achar que não conseguiria colocar nomes em todos os animais. Perdido e sem saber o que fazer, seus olhos repousaram sobre a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal. E estava sozinho.
 Aproximou-se da árvore, como se tivesse hipnotizado pela sua própria frustração. Um passarinho rapidamente pousou sobre o seu ombro, cantando em seu ouvido uma canção estridente, que o trouxe à realidade como quando se acorda de um sonho com sobressalto.
 Assustado com o que podia fazer, tão perto daquela árvore proibida, tratou de demarcar aquela árvore, com um risco no chão para que sempre que estivesse próximo, se lembrasse do perigo dela.

Capítulo 6: quando Deus chamou Adão pelo nome.

O leão e o cordeiro observavam de longe, sem serem notados. A silhueta do homem e de Deus debaixo da Árvore da Vida, comendo aquela deliciosa fruta sem ficarem cheios e conversando muito sem que o tempo passasse, chamou a atenção de um zoológico de bichos que se espremia para não serem vistos atrás de uns arbustos. A pobre girafa era a que mais sofria.
Deus ensinava longamente ao homem sobre as coisas do campo, sobre como plantar, como cuidar dos animais, sobre os valores nutritivos das frutas; também, Adão pôde ouvir da própria boca de Deus como ele havia criado o mundo:
- Aí eu disse: que haja luz, e houve luz! E à luz eu chamei Dia, e à escuridão eu chamei Noite.
 Mas era tanta informação, que Adão estava ainda meio atordoado, tentando entender as coisas. Com o que aprendera com Deus, fabricou uma tinta vermelha e começou a escrever tudo o que tinha aprendido num grupo de pedras ali perto.
- Quero, agora, que dê um nome a tudo o que falta ser nomeado. Pois tudo o que criei eu coloquei sobre o seu governo, e a você cabe governar o mundo, dando nome a tudo.
 Nisso, Deus estendeu a mão aos animais escondidos atrás dos arbustos, que se aproximavam timidamente. E também foram chegando cada vez mais bichos, e devagar as árvores iam ficando coloridas de tantas aves diferentes, e o rio se movimentava ferozmente com a movimentação dos animais aquáticos dos mais diversos.
Adão ficou muito entusiasmado com a tarefa. Deus tomou distância e se sentou no meio do leão e do cordeiro, numa pedra, enquanto o homem tentava se encontrar naquela fila de animais.
 - Você se chamará tamanduá, certo? Grave esse nome – dizia ao bicho, e depois ia na pedra e escrevia, esboçando um desenho do animal.
Antes de dar o nome ao animal, Adão observava quantas patas tinha, o formato do nariz, se tinha chifres etc. Se segurou para não rir quando apareceu o ornitorrinco. Achou o bicho tão engraçado que olhou pra Deus com aquele olhar: “o que foi que você fez aqui?”
Depois que Adão deu um nome a ele, Deus chamou o bicho, que foi receber o carinho de debaixo de suas mãos.
Chegou uma hora que Adão se atrapalhou todo! Havia misturado alguns bichos e tinha perdido a 'lista de répteis', e colocado o jacaré na de “felinos”. Deus observou junto do cordeiro:
 - Não é bom que o homem esteja só.
Após mais algum tempo, depois que deu nome aos diversos tipos de macacos, Adão parou, tocou-se a si mesmo, olhou-se nos espelhos d´água. Ficou sério, falando consigo mesmo. Se afastou dali, longe da vista de Deus, confuso. Foi então que disse:
 - Sei o nome de todas as coisas. Posso nomeá-las e ensinar a todos os outros. No entanto, quando olho para mim mesmo, não me conheço, não sei o meu nome.
O homem caminhou a ermo, distanciando-se de Deus. Envolvido na trama da confusão, todos os laços se desfizeram em fumaça quando ouviu de Deus um chamado:
- Adão!
O homem sabia que Deus estava falando com ele.

Capítulo 5: quando Adão deu um passeio com Deus.

Deus convidou Adão para um passeio. Era aquele final de manhã, perfumado e refrescante. Deus caminhava devagar, com os ouvidos inclinados cheios de bondade. Adão não parava de falar, estava muito entusiasmado para falar tudo o que tinha descoberto naquele pequeno pedaço do sexto dia. Suas falas eram interrompidas sem freadas bruscas; seus comentários eram aceitos como uma fruta saborosa; e também os comentários dEle vinham como um travesseiro para um corpo cansado. Ao lado de Adão caminhava alguém que realmente se importava e se alegrava com ele como nunca haverá outro na terra.
 Deus mesmo que apresentou os quatro rios que moravam no Jardim. Chegou a caminhar sobre as águas:
 - Vem também, você vai gostar.
 Aí Adão foi, deu o primeiro passo meio titubeante, mas depois correu feito menino!
 Então chegaram numa região do Jardim em que havia somente terra seca:
 - Onde estão as árvores? Que lugar triste!
 Deus levou Adão para uma colina muito alta, de onde se via todo o planeta. Dali dava para ver muito bem a beleza do jardim e a secura do outro lado ali perto.
 - Tudo isso foi feito para você, aproveite o quanto quiser! Quero deixar você como o grande cuidador deste jardim, você pode se alegrar e se servir com todas as plantas, frutas, com os rios, mas quero também que você cuide dele, proteja, e onde houver terra seca, quero que você cultive as árvores e flores que desejar.
 Sabe quando uma criança não espera ganhar nenhum presente, e daí seu pai chega com um embrulho todo colorido, e daí então quando ela abre o embrulho descobre que lá dentro está aquilo que o menino mais queria no mundo inteiro? Puxa! Adão estava muito mais alegre que aquele menino. Mas sabe quando a alegria é pega de surpresa e daí fica tão boba que não consegue nem sorrir? Era assim, Adão ficou calado até a cabeça dele processar tudo o que estava acontecendo. O coração tava esticando, pois estava lotado de satisfação.
 Desceram a colina, e agora estavam em frente a duas árvores. Aproximaram-se de uma árvore com flores muito coloridas, e com um fruto muito brilhante. Era alta, e parecia que havia frutos em todos os galhos.
 - Coma sempre deste fruto, e você viverá para sempre!
 Adão não pensou duas vezes e deu uma mordida na fruta. Puxa! O suco da fruta se espalhou fazendo delícias por todo o corpo e o sabor da fruta parecia que descia cantando pela garganta!
 - Você caprichou nessa, heim? Caramba, que fruta deliciosa! Que mais eu posso querer neste mundo?
 Adão nem percebeu que Deus estava diferente, meio triste, cabisbaixo.
 Está é a árvore do conhecimento do bem e do mal – Ele apontou para a segunda árvore, pequena, um pouco distante e sozinha – coma livremente de qualquer árvore do jardim, mas não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal, porque no dia em que dela comer, certamente você morrerá.
 - Beleza! - respondeu Adão, considerando que, diante de tanta coisa boa que Deus havia feito para ele, ia ser fichinha não comer do fruto de uma única árvore.

Capítulo 4: quando Adão se deleitou com cerejas!

Adão tinha comido umas cerejas e gostado pra valer. Agora, procurava a cerejeira e não a encontrava em lugar nenhum. Perguntou para os tamanduás:
- Uma árvore muito gostosa - ele dizia.
- Não é essa? - apontavam os tamanduás.
- Não, essa é outra…
- E essa?
- Também não. É outra ainda.
Procurou a manhã inteirinha, mas ficava difícil para os animais saberem o que o homem procurava, pois nada no mundo tinha nome ainda. A única maneira era descrever a fruta, mas naquele mundaréu do Jardim do Éden, como encontrar?
Quando Deus encontrou Adão, ele estava sentado sobre uma pedra, coçando o queixo, ruminando a pergunta: “onde é que deixei a tal árvore?”
Deus estava com a boca toda vermelha, comendo cerejas. Nas mãos ele cuspia os caroços. Adão viu Ele se aproximando, comendo aquelas cerejas todas, então encolheu os ombros, ergueu as sobrancelhas e, se Deus tivesse colocado um rabo nele, estaria abanando muito.
- Você quer? - perguntou Deus.
Mas nem precisava responder.
Então Deus cavucou a terra com uma das mãos, abrindo um buraco, e ali enterrou os caroços. Abaixou-se e soprou no montinho, e a raiz perfurou a terra e ergueu-se como uma cobra de um cesto, e depois, abriu-se em galhos, e dos galhos folhas, e frutas, muitas cerejas. Lá estava a cerejeira toda com cataporas de cerejas.
- É sua - presenteou Deus.
Aí Adão ergueu as palmas de suas duas mãos em concha para Deus, aguardando-a cheia. Mas Deus, ao invés de enchê-la, segurou suavemente as mãos de Adão pelos punhos, e as ergueu até as frutas: Adão mesmo que as colheu. Foram as cerejas mais gostosas que já comeu!

Capítulo 3: quando Adão ficou muito feliz com Deus.

Adão brincou com muitos animais, mas foi com o leão que ele brincou como se fossem dois moleques conhecendo a própria força. E foi Adão que começou. O leão lá, tranquilo, na dele, comendo suas folhas sossegado. O Adão é que foi lá, correndo para pegá-lo de surpresa. Ficou escondido atrás de uma árvore, esperando o momento em que o leão estivesse mais desatento.
- Xiiiii, não faça nenhum barulho – pediu Adão ao cordeiro, que estava junto, observando o que ele ia aprontar.
Adão aguardou o momento ideal e, de repente, correu como uma flecha gritando como um doido:
- Iaaaaaaah!
E trombou com força no leão, seus ombros no dorso do bicho. O leão voou longe, mas não deixou barato. Com a juba toda assanhada, e ainda se recompondo do baita susto, arrumou-se e se atirou com fúria sobre o homem. Deu que rolaram até caírem no rio Tigre. O cordeiro, vendo a festa, correu e pulou nos dois, chovendo neles com seu pulo. A brincadeira acabou com a gargalhada incontida de Adão, e o rugido alegre e os pulos de lá pra cá do leão, batendo na água. Já o cordeiro, tadinho, ainda não tinha aprendido a nadar, e chegou sem fôlego na margem.
Adão estava aproveitando ao máximo aquela manhã. O leão, o cordeiro e ele acamparam em uma laranjeira na margem do rio e ali comeram laranja; Adão fez suco de laranja com a água do rio Tigre, e o cordeiro trouxe uma melancia, e o leão foi pegar umas cerejas. Ah, as cerejas, Adão achou elas deliciosas!
Só naquela manhã já tinham perseguido os macacos: Adão pulava entre as árvores sem dever aos macacos em agilidade, pulos, graças e tolices de fazer caretas e emitir gritos em vão; e também já tinham acordado os ursos, que saíram correndo atrás deles, gritando zangados:
- Sumam daqui moleques encrenqueiros!
Ali, debaixo da laranjeira, Adão contou aos amigos a história que veio gravada na mente dele, de fábrica.
- No princípio criou Deus os céus e a terra. A terra era sem forma e vazia, e o espírito de Deus pairava sobre a face do abismo. E disse Deus: haja luz, e houve luz! - e continuou contando, e o leão e o cordeiro ouviam atentos.
Mais tarde, quando foi pular da maior cachoeira que encontrou, percebeu que Ele o observava. Desistiu de pular e, meio quieto de timidez, ficou a procurá-lO. Encontrou-O colhendo laranjas, descascando e saboreando, assim, de olhos fechados, exclamando:
- Vi que esta fruta é boa!
Adão observava escondido: a timidez mantinha Adão a admirá-lO em silêncio, no seu canto. E de longe, motivado por uma imensa gratidão, Adão fechou os olhos, e falou com o coração:
- Isso mesmo, meu querido Deus, tudo o que você fez é muito bom!

Capítulo 2: quando Adão teve uma grande surpresa.

Adão passeava de peito estufado, desfilava pelo jardim do Éden vestido de dono do mundo. Depois que já tinha dominado todos os seus movimentos, sabia correr, sabia gritar, sabia rir, mexer os braços e essas coisas, agora caminhava devagar, solenemente, como um supervisor cheio de moral, enquanto os animais, dos mais mansos aos mais ferozes escondiam-se dele, e observavam de longe, entre as árvores, a figura temida e respeitada do homem.
- UUUaaaarh! - espreguiçou, depois deu aquela indireta, pra todos ouvirem, naquela língua que todo mundo entendia – eu sou o Rei do Mundo, e quero um copo de água!
Daí todos ficaram agitados, mas foram os passarinhos que fizeram um copo de umas folhas e buscaram a desejada água no rio, límpido e cristalino. Adão só ergueu a boca, e os passarinhos emborcaram a água. Depois se recolheram todos tímidos, nas copas das árvores, observando o varão de longe.
- Eita água gostosa! - Adão bateu na pança, satisfeito – mas que vontade de comer umas frutas!
Daí foram os macacos que pularam de galho em galho até encontrarem um cacho de banana mais bonito que todos os outros, e levaram cheios de reverência, colocando aos pés de Adão. Adão comeu uma, comeu outra.
- Que delícia de frutas! Parece até que fui eu que fiz! - e os animais concordavam uns com os outros – sim, é uma delícia mesmo...
Mas de repente, quando Adão estava pronto pra dizer – Mas que vontade de tirar uma soneca numa rede!, ouviram um assobio se aproximando, um assobio encantador, de um cântico que todos entendiam:
“Vós, criaturas de Deus Pai, todos erguei a voz, cantai! Oh! Louvai-O! Aleluia! Tu, sol dourado a refulgir, Tu, lua em prata a reluzir, Oh! Louvai-O! Oh! Louvai-O! Aleluia! Aleluia! Aleluia!...”*
Era Deus, que andava pelo jardim enquanto soprava a brisa do dia, e enquanto caminhava, as flores iam se abrindo, árvores brotavam da terra, passarinhos e borboletas emergiam do barro como peixes da água e corriam assobiando em coro ao redor do Criador.
Quando Adão percebeu quem era, correu desesperado para trás dos cachorrinhos, encolhido cheio de timidez. Deus parou e soprou um gostoso ar sobre todo o jardim, e tudo ficou ainda mais cheio de vida ao seu redor. Olhou para tudo e continuou sua caminhada, assobiando o cântico. Mas antes exclamou para si, todo coberto de alegria:
- Estou vendo que tudo o que fiz é bom!
Quando o assobio já se ouvia distante, os animais voltaram-se para Adão, todo encolhido, meio envergonhado. Foi a hiena quem teve coragem de primeiro estourar em uma gargalhada, como uma faísca de gargalhada num tonel de gargalhada, então explodiram todos os animais numa grande festa em torno da figura engraçada de Adão, tímido. Rendido pela sinceridade dos animais, até Adão rolou de rir com eles.

*Hino 10, Novo Cântico, A criação e seu Criador.

Não perca o terceiro capítulo de O Romance de Adão e Eva.

Capítulo 1: quando Adão acordou.

De repente Adão abriu os olhos, mas estava tão claro que ele logo voltou a escondê-los: era manhã do sexto dia.
Tinha recebido uma rajada de ar no pulmão e depois sentiu seu sangue correr, como quando nosso braço vai deixando a dormência, sabe? Ele movimentou os dedos das mãos e dos pés devagar, deu uma torcida no pescoço. Só depois pensou em abrir os olhos, mas estava tão claro que ele logo voltou a escondê-los.
Custou para abrir de novo. Mas abriu, devagar, e as luzes do dia entravam de mansinho pelas frestas das cortinas dos olhos. Ali, deitado, ia descobrindo o mundo, enquanto o amarelão solar ia tomando a forma das nuvens e do céu azul, para onde apontavam os olhos de Adão; depois começou a ouvir as águas do rio, os pássaros, e os bichos e o vento, e descobriu também o sentir molhado da grama em suas costas, e o cheirar, ah!, sentiu o cheiro das plantas e das frutas das árvores que o cercavam. Piscou. Piscou de novo. Era estranho, Adão estava se descobrindo. Sentiu-se pela primeira vez, era homem feito. Ia então descobrindo seus movimentos. Mexeu o pescoço novamente, sentiu aí uma dorzinha, aquela dor gostosa que a gente tem quando acorda de um sono bom, e dá aquela espreguiçada. Era a dor do primeiro movimento. E como um grilo lhe pulasse no rosto, descobriu o impulso ao golpear-se com as mãos na testa, tentando defender-se do inseto. Aí Adão já estava sentado. Admirado. Boquiaberto.
Ergueu-se, porque se sentia poderoso agora. Ia descobrindo todos os movimentos possíveis. Primeiro, dobrou os joelhos ameaçando um pulo, sem, no entanto, tirar os pés do chão. Aí, movimentou os quadris, e os braços, e depois bem rápido. Descobriu o pulo, pulou uma, duas três cada vez mais alto, aí mudou de lugar, descobriu o passo, e estava a um passo de descobrir o correr, e começou a correr, e era tão bom, o vento batendo no rosto, sentiu os músculos do coração se apressarem, o sangue correndo como nunca pela primeira vez, o vento no rosto, corria cada vez mais veloz como nenhum homem jamais correu depois dele, corria vendo todo o mundo maravilhoso e tudo era novo. Correu, correu e tão maravilhado que sentiu um vento em sua garganta e as cordas vibrarem, e formigar a barriga, e o coração batendo, e franzir a testa, era riso era alegria, ele estava descobrindo a maior gargalhada do mundo, que começou tímida, mas riu muito, à beça, teve que parar.
Ficou sério, olhou para o seu mundo, sobre o qual ele terá o domínio a partir daquele momento. O seu coração agora era vigor. Respirou, inflou o peito. Ergueu o queixo como mostrando autoridade, e inventou o maior grito de todos os tempos. A explosão saiu-lhe das entranhas e chegou aos ouvidos do animal mais feroz e mais longínquo do recente planeta. Adão gritou.



Não perca o capítulo 2 de O Romance de Adão e Eva.